Ratiu Studiorum (1599-1749)
Ratiu Studiorum (1599-1749)

Segundo Saviani (2010, p.56), o Ratio Studiorum, é considerado uma organização e plano de estudos da Companhia de Jesus, publicado em 1599, a partir de elementos da cultura européia, evidenciando assim o desinteresse de instruir também os índios, o plano contido no Ratio era de caráter Universalista (adotado por todos os jesuítas em qualquer lugar) e Elitista (destinado aos filhos dos colonos – excluindo os indígenas – formação da elite colonial). Este novo plano excluía as etapas de estudos instituídas por Nóbrega, a educação toma dois rumos: educar os colonizadores e catequizar os índios, tornando-os mais “dóceis” e mão de obra barata. Conforme o autor diferente das dificuldades da primeira fase (período heróico 1549-1570), a segunda fase (último quartel do século XVI), foi um período marcado pela prosperidade, facilidade e conforto, pois dez por cento dos impostos da colônia eram destinados à manutenção dos colégios jesuíticos.

É importante ressaltar que antecedendo o Ratio, o autor descreve sobre o modus italicus e modus parisiensis, que consistia nos seguintes métodos de ensino:

- modus italicus (século XV), método utilizado nas regiões da Itália, caracterizava por não seguir um programa estruturado e nem vincular a assistência dos discípulos a determinada disciplina, podiam passar para outra disciplina sem nenhum pré-requisito, os grupos eram por diferentes idades e níveis de formação.

- modus parisienses (século XVI), método adotado pela capital da França-Paris, marca da Universidade de Paris, tem com aspectos básicos:

1)Distribuição de alunos em classes (mesma idade e mesmo nível de instrução, classe regida por 1 professor)

2) Exercícios escolares (mobilizar processo do aluno para a aprendizagem, baseado na Escolástica, que tinha como pilares a lectio (preeleção dos assuntos a ser estudados); exame questiones (suscitados pelo lectio); repetitiones (alunos em grupos pequenos que repetiam as lições explanadas)

3) Mecanismo de incentivo (castigos corporais e prêmios)

Tendo como base o modo de estrutura de ensino parisiense por terem estudado em Paris, os Jesuítas desde o primeiro Colégio de Messina (1548) o consagrou no Ratio e regulou o seu funcionamento, sendo o Padre Nadal e mais seis de oito padres que deram inicio aos primeiros Colégios Jesuítas. (Saviani, 2010, p.52)

Continuemos com as idéias de Saviani (2010), que nos aponta a criação de uma Regra comum aos colégios foi implantada primeiramente em 1584 pelo padre Cláudio Aquaviva, que elaborou uma primeira versão em 1586 destinada apenas à apreciação e críticas das autoridades responsáveis pelos melhores colégios da Companhia. A partir daí, Aquaviva designou três compiladores e associou uma comissão com os professores mais notáveis do Colégio de Roma para a criação de uma nova versão, que foi encaminhada a todos os colégios em 1591 em caráter experimental, após três anos os resultados dessa experiência chegaram a Roma e em 1599 foi feita a versão definitiva do Ratio.

O código representado pelo Ratio contém 467 regras, o plano é constituído por um conjunto de regras para todas as atividades dos agentes ligados ao ensino. Previa além da figura do reitor, o prefeito de estudos, que auxiliava ao reitor na boa orientação aos estudos, essa ideia de supervisão educacional distinta de reitor e professor e sim denominada “prefeito” trata de uma forma aproximada de um sistema educacional (Saviani, 2010, p. 53-55).

Pedagogicamente, o autor relata que o Ratio Studiorum foi considerado de grande êxito, além de ter formado um extenso número de intelectuais como Descartes, Montesquieu, Rousseau, Diderot, entre outros.

“As instituições se multiplicaram de forma expressiva, chegando a um total de 728 casas de ensino em 1750" (Saviani, 2010, p.57).

- Organização do Plano, de acordo com Saviani (2010, p. 56-58)

  • Estudos inferiores: Curso de Humanidades (6-7 anos de duração) conteúdo reeditava o Trivium da Idade Média.
  • Estudos superiores: Filosofia (3 anos) e Teologia (4 anos)

A pedagogia jesuíta predominou 2 séculos, até 1759, quando se deu a expulsão dos Jesuítas e de suas colônias pelo ato de Marques de Pombal, então 1º ministro do rei Dom José I. No entanto, o ideário pedagógico subjacente ao Ratio Studiorum é o que chamamos comumente de pedagogia tradicional, conforme nos relata Saviani (2010), baseada nos ensinos de Aristóteles (no curso de Filosofia) e Tomás de Aquino (no de Teologia), o plano de Estudos da Companhia de Jesus desempenhou um papel de grande importância no desenvolvimento da educação moderna.

 

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A “máquina mercante” e as metamorfoses na Educação

A Acumulação Primitiva do Capital (MARX, 1985) é o processo histórico originário que simultaneamente dava origem ao Capitalismo e fazia padecer o mundo Feudal. Em outras palavras o processo de “acumulação primitiva” desenvolvia pouco a pouco as potencialidades da nascente sociedade burguesa enquanto fazia fenecer as sociabilidades feudais.  Com inícios entre os Séculos XIV e XV tal processo se caracteriza pela separação violenta dos trabalhadores dos meios de produção, do camponês do campo e do artesão de seus instrumentais de trabalho.  Esta separação aconteceu pela expulsão dos servos, por arrendatários, das terras senhoriais,  das terras comunais pelos cercamentos para criação de pasto, como também a Reforma Protestante desembocou em circunstâncias tais que  não apenas feriu institucional e teologicamente a Igreja Católica,  mas provocou mesmo um processo no qual suas terras e tesouros foram rapinados, comprados a baixo custo ou mesmo tomados à força,  por fim, a própria Revolução Inglesa serviu como algoz final  estruturando em bases  legais (leis de vadiagem) e políticas (Câmara dos Comuns) a propriedade privada e o mundo burguês.

O fato é que enquanto este processo se desenrolava, Portugal e Espanha protagonizavam um desenvolvimento histórico diferente, pode-se dizer oposto. Encabeçavam uma política colonialista em associação com a Igreja Católica visando enriquecer e manterem-se às custas do trabalho e riquezas dos territórios dominados. Apesar de assentar-se no trabalho escravo, mais precário que a servidão e menos produtivo que o assalariado, a política colonialista instaurou um modelo de produção “com ares de modernidade”, com a instalação de grandes monoculturas voltadas para o mercado externo, a qual de maneira indireta auxiliava no processo de acumulação do capital na medida que aumentava o comércio, a geração e concentração de riquezas.  O feudalismo pouco a pouco se desagregava de Portugal, porém sem a consolidação do capitalismo.

Antonio Vieira aconselha ao Rei Dom João IV a fundar a Companhia das Índias Ocidentais. Porém ainda se mantinha fiel a ordem do poder dos Jesuítas diante do poder laico que tendia a dominar o aparato estatal. (Saviani, 2010, p.66).

Os impérios mercantis salvacionistas surgem na passagem do séc. XV AO XVI em duas áreas marginais – tanto geográfica como culturalmente - da Europa: A Ibéria e a Rússia. Ambos tiraram, das energias mobilizadas para reconquista de seus territórios ocupados por Árabes e por Tártaros – Mongóis, as forças necessárias para as façanhas de sua própria expansão salvacionista.(Darci apud Ribeiro, 1998, p.30 ).

Por outro lado, a Igreja Católica em decadência “moral e material” na maior parte da Europa recebia apoio político e Econômico do Reinado português, nesse sentido, a redízima instaurada em 1560 não pode-se ser entendida apenas como um símbolo de  “gratidão”, pelos serviços prestados, mas, também, como uma medida política de apoio concreto à uma instituição em flagrante crise.

Os 200 anos que se seguiram na colônia andavam, por conseguinte, em certo descompasso, ou em um compasso particular, da Europa inflamada de então.  Os Jesuítas responsáveis inicialmente pela educação, “adestramento”, dos indígenas; foram alçados, na falta de pessoas capacitadas, para realizar a Educação formal dos filhos dos colonos. Os hospitais criados estavam também sob suas responsabilidades; através de doações de terras, isenções de impostos e subsídios diretos da Coroa, passaram a administrar propriedades, negros e índios. Assim a influência dos jesuítas criada artificialmente através da delegação de tarefas educacionais e de saúde, posteriormente por meio de  investimentos, doações e subsídios diretos, começou a aumentar naturalmente  estruturando-se como um poder enraizado religiosa, política e economicamente. Criou-se então um cenário interessante onde os jesuítas tinham monoculturas subsidiadas, propriedade de escravos e controle da educação de vastos territórios. A concorrência desleal gerava indgnação nos colonos produtores de açúcar os quais pressionavam o poder central, este por sua vez já se incomodava com o poder e prestigio ganhos pela igreja católica representada pelos Jesuítas no Brasil. Não obstante, este quadro uniu-se a questão política, como descreve Saviani (2010):

Ao quadro econômico descrito juntou-se a questão política das terras missioneiras, quando as coroas Espanha e Portugal se voltaram conjuntamente contra os jesuítas. Por um acordo, em 1725 que previa o casamento do herdeiro do trono espanhol, Dom Fernando, com dona Maria Bárbara de Bragança e Dom José, herdeiro do trono portugês, com dona Mariana Vitória de Bourbon, o que se efetivou em 1729, as duas coroas uniram-se. E, em 1750, mesmo ano em que ascendeu ao trono Dom José I, celebrou-se o tratado de Madri, que aboliu o tratado de Tordesilhas e dividiu as colônias da América entre Portugal e Espanha conforme o princípio do Uti Possetis, isto é, de acordo com o domínio efetivo dos teritórios. Estando contra os termos do Tratado de Madri, os jesuítas se indispuseram-se com as duas colônias. (Saviani, 2010, p.69.)

Francisco Xavier de Mendonça Furtado faz muitas denúncias aos jesuítas, como aproveitamento do trabalho indígena, ordenança a venda de drogas, etc. E, além disso, os jesuítas recusavam-se a obedecer ás bulas papais, determinações reais, o que culminou na expulsão decretada em 1759. (Saviani, 2010, p.75)