Estado e Educação de 1945 até 1964
Estado e Educação de 1945 até 1964

O sustentáculo ideológico da burguesia industrial, para assegurar os interesses de classe nessa fase de transformações econômicas e sociais do país, deu-se com o chamado nacionalismo. Esse fenômeno teve o objetivo de pactuar as contradições políticas desse período; procurou conciliar os interesses de classe ou intentou superar as contradições entre a burguesia industrial nacional e a classe trabalhadora. A ideologia nacionalista burguesa teve um caráter de luta emancipatória econômica do país face ao capitalismo internacional; para tanto, buscou aliança com o proletariado e a classe média, subordinando-os aos interesses de apropriação do produto de seu trabalho. Em verdade, burguesia e proletariado tinham uma relação conciliatória contraditória. Se, de um lado, uniram-se contra os trustes, que queriam o Brasil como uma economia periférica, subserviente aos países europeus e aos Estados Unidos, de outro lado, no plano nacional, as relações de classe se antagonizaram, sobretudo referente à exploração da burguesia sobre o produto da força de trabalho do proletariado (IANNI, 1963).  

A análise desse período nacional-desenvolvimentismo mostra que o capital industrial, enquanto elemento decisivo do sistema produtivo nacional a ser investido, nessa fase, estava em condição direta e indireta, em seu surgimento, do capital agrícola. Essa situação nos leva a pensar que a relação estrutural entre a economia brasileira e a economia internacional, significativamente a economia americana e europeia, fez com que o processo de transição, complexo e mediato, do capital agrícola para o industrial fosse realizado pelo capital financeiro e comercial. A diversificação do sistema produtivo, com foco na industrialização nos espaços urbanos, foi proporcionada, em seu cerne, pelo capital agrícola. Com isso, o Estado transfere consideráveis excedentes produzidos pela economia agrícola para a indústria urbana. Igualmente, a política cambial e fiscal do governo Vargas, com a instrução nº 70, em 1953, terá a função de orientar o fluxo de capital e transferi-lo para o desenvolvimento industrial.

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Decerto, esse período caracterizou-se por uma política econômica cujo objetivo foi o processo de acumulação de capital, que se tornou o baluarte do desenvolvimento. O Estado foi o responsável direto pelas ingerências no processo da industrialização brasileira, mediante, principalmente, políticas cambiais e fiscais. A interferência estatal no plano econômico demonstrou uma forte tendência monopolista, quando revelou primeiramente sua iniciativa de controle sobre a poupança e investimento de capital financeiro. Esse intervencionismo, ao assegurar a expansão das forças produtivas, teve por objetivo formar, no sistema de mercado, uma densa e concentrada produção de capital.  Esse processo de acumulação de capital levou em consideração dois fatores fundamentais: as conversões dos preços de intercâmbio e a entrada de recursos externos. Com a instrução nº 70, da Superintendência da Moeda e do Crédito (SUMOC), o Estado manteve o lucro excedente, proveniente, sobretudo, do capital agrícola e com ágios decorrentes de divisas dos importadores. Ademais, ainda no governo Vargas, em 1954, houve uma política de tributos que favoreceu o financiamento da importação de equipamentos relevantes para a estruturação do parque industrial nacional e também a entrada de capital estrangeiro em forma de maquinarias sem controle cambial. É possível afirmar, portanto, que em muitas circunstâncias, no período nacional-desenvolvimentista, o capital nacional e o capital estrangeiro mantiveram-se associados (IANNI, 1964).   

Essa relação entre capital nacional e estrangeiro foi regimentada em 1955, no governo Café Filho, com a Instrução nº 113, da SUMOC, em que se apresentaram condições positivas para a entrada de capitais externos no Brasil, com prerrogativas que asseguraram aos investidores estrangeiros a importação de máquinas e equipamentos com uma política cambial favorável. Isso não significou, porém, que o governo não se preocupou com medidas que protegessem os capitais nacionais. O quer dizer que as correlações de força econômica e política entre classe ou frações de classe burguesa forçaram o governo a proteger e robustecer o sistema produtivo nacional. Para isso, a política aduaneira foi uma peça indispensável para a substituição de importação de bens não duráveis e avançando para atender a produção de meios de produção. Daí, também, a imperiosidade de estabelecer tarifas e medidas de controle cambial para especificar os tipos de importação que atendessem ao desenvolvimento econômico. Essas contradições, traduzidas nas instruções governamentais de incentivar a entrada de capitais externos e, ao mesmo tempo, de proteger os capitais nacionais, perpassaram por toda a política econômica nesse período em questão (IANNI, 1964).  Foi essa política que iniciou o processo de substituição de importações.

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Assim, tal política possibilitou a reorganização do aparelho do Estado, que passou a exercer papel fundamental na execução do projeto de desenvolvimento do capitalismo no Brasil. Em conformidade com o que foi salientado anteriormente, baseado em Ianni, cabe ratificar que a intervenção crescente do Estado na economia efetiva-se tomando uma série de iniciativas de proteção ao setor industrial, concedendo privilégios especiais quanto à política fiscal e de crédito, ao estímulo à produção, às garantias de comercialização, à formação de capitais através de confisco cambial, etc., com o objetivo de impulsionar a ampliação da produção industrial. Tais privilégios são criados contra os interesses dos produtores rurais, completamente afetados pelas iniciativas governamentais em benefício dos setores detentores do capital industrial. Em momento de crises econômicas e políticas, embora o Estado tome medidas de favorecimento ao setor agrário (garantias de preços de café, compra de excedentes, etc.), estas iniciativas visam apenas poupar a posição do Estado em relação à balança comercial necessária à expansão da importação de máquinas e de tecnologias indispensáveis ao desenvolvimento industrial (RODRIGUES, 1987, p. 30 e 31).

Vale ressaltar que essa proteção só foi viabilizada por causa da coalizão de classes atreladas à produção industrial (burguesia industrial, pequena burguesia, provenientes do setor de serviços, e o proletariado). Decerto, no período que durou a implantação e consolidação da industrialização – 1930 e 1961 – com o intuito de substituir a importação, as classes sociais ligadas à produção industrial, ao setor de serviços e à burocracia estabeleceram entre si uma aliança que possibilitou o acobertamento da contradição entre o capital e o trabalho, e garantiu a “paz social” disseminada pela burguesia, através de seus representantes no governo (WARDE, 1979, p. 65).

Pode-se afirmar que o propósito da aliança foi sustentar o desenvolvimento industrial e tentar afastar todas as investidas da oligarquia rural. Desse modo, o Estado é impulsionado pelas classes defensoras do capitalismo industrial a intervir na produção, tanto pela necessidade de oferecer as condições básicas de infraestrutura, quanto para apressar a acumulação inicial do capital, financiando projetos, transferindo recurso dos setores não privilegiados do sistema, disciplinando o trabalho e promovendo a formação de recursos humanos. Por outro lado, o Estado se apresenta “acima dos interesses de classe”; age como harmonizador dos interesses divergentes e antagônicos, enfim, procura aviltar as dissensões dentro do próprio pacto firmado entre as classes representantes do modo de produção do capital industrial (SANTOS, 2007).

O presente texto não tem a pretensão de aprofundar essa questão. Essa breve discussão preocupa-se em mostrar, tão somente, a importância do Estado como mediador ou, pode-se dizer, como Estado de classe, que planeja a produção econômica nacional para chegar à acumulação do capital. Ou seja, o Estado tornou-se decisivo para pensar e ordenar diversas esferas da economia com o fito de mudar e expandir progressivamente as forças produtivas. O Programa de Metas, o Plano Trienal, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico – BNDE, a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste são, entre outros, órgãos e planejamentos estatais e governamentais surgidos a partir de 1948 para promover uma tentativa de reestruturar e diversificar a economia brasileira. Por conseguinte, o Estado teve uma função insofismável na orientação e dinamização do crescimento das forças produtivas com programas setoriais e regionais de desenvolvimento. Ao institucionalizar tais ações, o governo estruturou uma intervenção mais expansionista do processo econômico brasileiro, dando maior destaque à indústria.  

Essa sucessão histórica das etapas de expansão do setor industrial é sintetizada por Ianni da seguinte maneira:

  1. A ruptura parcial e a recomposição (sucessiva e alternadamente) das relações políticas e econômicas com a sociedade tradicional e com os sistemas externos.
  2. A frustração das tentativas de implantação de um modelo de desenvolvimento econômico autônomo.
  3. A combinação dos modelos exportador, substituição e associado, ou internacionalista, num sistema econômico heterogêneo e contraditório.
  4. A participação crescente do Estado no comando do processo econômico.
  5. A transformação da região Centro-Sul (com centros nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte) em núcleo hegemônico na economia nacional.
  6. A formação dos movimentos de massa, como estruturas políticas e ideológicas de sustentação do poder político orientado para o desenvolvimento industrial (1971, p. 35).

Com as transformações introduzidas nas relações de produção e a concentração cada vez mais ampla da população em centros urbanos, tornaram-se fundamentais novos requerimentos de qualificação para o trabalho; do mesmo modo, de oferecer instruções básicas à população, pela premência do consumo que essa produção requer. Portanto, as exigências do novo modo de produção e do consumo ocasionaram modificações importantes na forma de conceber a educação, tendo o Estado como o principal fomentador das políticas educacionais. Isto se observa nas propostas em relação a reforma da educação brasileira, a partir de 1930. Sucessivamente, a luta pela Escola Nova, a escola industrial e profissionalizante (SENAI, SESI, em 1942), a reforma de Capanema (1942), a primeira Lei de Diretrizes e Base (1961) e a Reforma do Ensino Superior (1968) e de 1° e 2° graus (1971), até a institucionalização do Mobral (1967), têm procurado realizar o ajustamento da escola para a efetuação das funções caracterizadas como necessidades do modelo de desenvolvimento implantado (RODRIGUES, 1987, p. 48).

A constituição de 1946 (no período da chamada etapa educacional populista: 1946-1960) levou à precisão de elaborar leis e diretrizes para o ensino. Começa a longa peregrinação da lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, sancionada somente em 1961. Essa lei visava substituir a Reforma Capanema de 1942. Em 1948, o Ministro Clemente Mariani encaminha o primeiro Projeto-de-Lei, que propõe a rede escolar gratuita até o secundário e cria a equivalência dos cursos de nível médio, mediante prova de adaptação. Esse anteprojeto correspondia, em seu cerne, ao que previa a Constituição, pois aludia aos direitos à educação; apresentava a obrigatoriedade e gratuidade do ensino primário e gratuidade da escola pública em seus vários níveis de ensino; de igual modo, colocava as obrigações e responsabilidades do Estado relativas ao “sistema” de ensino: financeiro, administrativo e pedagógico. Entretanto, esse projeto foi engavetado. Surgiu, então, em 15 de janeiro de 1959, o Projeto-de-Lei chamado de “Substitutivo Lacerda”, o qual propôs, entre outras coisas, que a sociedade civil assumisse o controle da educação, defendendo, à vista disso, uma das formas de privatização do ensino: a educação seria financiada pelo Estado, porém a responsabilidade do financiamento estatal estaria vinculada às entidades privadas; uma forma de delegação do financiamento público aos usuários do sistema, cuja prestação educacional caberia às instituições privadas. Para isso, argumentava e alegava-se a chamada “liberdade de ensino” (SAVIANI, 1999).


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Em verdade, com a discussão da primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, durante o longo período que compreendeu de 1946 a 1961, constatou-se uma disputa de duas propostas de LDB, que traduziu a relação contraditória no âmbito político-econômico, cujo embate aconteceu entre dois grupos: o que defendia o nacionalismo desenvolvimentista, no qual o Estado seria o carro-chefe no planejamento da economia, estratégico para o desenvolvimento do mercado nacional, sem a dependência total e asfixiante do capital externo; e o outro grupo, que sustentava a tese de que a iniciativa privada seria o mecanismo de gerir a economia e a educação institucionalizada, ao objetar qualquer intervenção normatizadora e fiscalizadora do Estado, tanto na área econômica como na educacional. Essas observações são vitais para compreender exatamente a onipresença do Estado no planejamento das instituições econômicas, sociais e educacionais (SANTOS, 2007).  

Assim sendo, a educação, nesse período, foi pensada sob essa influência nacional-desenvolvimentista. De 1956 a 1961, o Brasil passou por um momento crucial, que sistematizou o plano setorial e global, e a educação foi pauta de um plano setorial do governo. Uma das posições proeminentes, que se colocou nesse período, foi o pensamento segundo o qual a relação entre educação e desenvolvimento era condição indispensável para a plataforma de metas. No governo de Kubitschek, em 1956, a defesa do desenvolvimentismo se converteu na implementação de diretrizes para o Plano Nacional de Desenvolvimento. O primeiro passo nesse sentido foi a criação do Conselho de Desenvolvimento, subordinado ao presidente da República e cujos membros eram compostos por ministros do Estado, chefes da Casa Civil e Militar e pelo presidente do BNDE. Nesse conselho, foi proposta a criação de Grupos de Trabalho, formados, em sua maioria, por técnicos que já haviam participado de planejamentos econômicos em governos anteriores e que, agora, seriam responsáveis por traçar um Plano Econômico, conhecido comumente como Programa de Metas.

Nesse Programa de Metas, destacam-se quatro eixos norteadores para a política econômica: 1 – detecção de áreas com demandas não atendidas que estrangulavam a economia (planejamento das áreas de energia, transporte, etc.); 2 – construção de infraestrutura, mormente o investimento de rodovias com a finalidade de integrar as diversas regiões do Brasil; 3 – restrições de importação. Elemento fundamental, balizador da política de substituição de importações, instituindo quais seriam os bens de consumo e de produção que deveriam ser produzidos no Brasil; 4 – o atendimento de exigências da produção de outros setores, provocando, com isso, um sistema econômico em que as premissas fossem intercaladas, ou seja, metas que demandariam o surgimento de outras metas na política econômica (HORTA, 1982).

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A educação que, inicialmente, não estava em nenhum dos setores do Conselho de Desenvolvimento, passa a ser considerada na Política de Metas; isto porque, com a demanda derivativa, como foi especificado no item 4, logo acima, a produção econômica gerava a necessidade de formação de técnicos em diversos níveis e áreas. Desse modo, em 1957, o primeiro indicativo da importância da educação no Programa de Metas foi a instituição da Comissão de Educação e Cultura, do Conselho de Desenvolvimento. Essa comissão delineou em dois meses um projeto de metas educacionais para atender o desenvolvimento econômico do Programa de governo. Em 1958, o ministério da Educação integrou-se ao Conselho. Esse foi um sinal explícito da relação entre educação e desenvolvimento, cabendo à educação a incumbência de preparar técnicos para atender a produção econômica em ascensão. Segundo a Comissão, uma educação que não esteja pautada nos quatro eixos do Programa de Metas pode se tornar uma barreira para o desenvolvimento das atividades produtivas. Os motivos anunciados pelos mentores do programa tentaram apresentar uma justificativa “humanística” da proposta que não causasse um impacto negativo entre os educadores e pesquisadores da educação:

A educação para o desenvolvimento não é, como a referência às transformações econômicas da sociedade pode deixar parecer, uma educação puramente técnica, sem objetivo ético e conteúdo humanístico. No que diz respeito ao objetivo ético, cumpre notar que a educação para o desenvolvimento requer, tanto o preparo intelectual do indivíduo, como a sua formação moral, o domínio de si próprio, o senso do bem-estar coletivo; a austeridade do consumir, a formação da gama de virtudes do realizador, que não é outra senão a das virtudes cristãs, a que a educação de hoje, completamente intelectualizada, voltou as costas inteiramente. No que diz respeito ao humanismo, cabe lembrar que o verdadeiro humanismo pressupõe integração do homem nas condições circunstanciais do seu meio e do seu tempo e procura a equação dessas condições e do que há de perene no próprio homem. Na educação para o desenvolvimento, concebida como um novo humanismo pedagógico, cada indivíduo é visto como protagonista da sua época, como veículo de soluções comuns reclamadas pela coletividade, soluções em que se harmonizam o permanente e o circunstancial (Brasil, Conselho de Desenvolvimento, Programas de Metas, 1957 apud  HORTA, 1982, p. 31 e 32).

Nota-se, nessa exposição de motivos, que a educação condiciona-se, com uma estrutura de dispositivos e de ações no Programa de Metas, aos requerimentos de uma economia em rápida expansão. Esse fato puxa uma discussão sobre a função da educação no processo de desenvolvimento. De um lado, havia posicionamentos que defendiam o desenvolvimento educacional como decorrência do crescimento econômico. De outro, a educação seria uma exigência já estabelecida antes do desenvolvimento econômico (HORTA, 1982; ABREU, 1963).

 Essa questão foi aprofundada, em seguida, pelo Instituto Superior de Estudos Brasileiros – ISEB, uma instituição de pesquisadores, criada e mantida pelo Estado brasileiro em 1955, com o escopo de investigar a realidade brasileira, fundamentado, epistemologicamente, nas Ciências Sociais (TOLEDO, 1997). Esse instituto pronunciou-se favoravelmente a respeito da primordialidade de uma ideologia do desenvolvimento, ao conceber a educação como elemento disseminador de tal ideologia e a premência de um planejamento educacional vinculado ao programa econômico e social, com o preceito de que a educação não é um fenômeno que antecede o desenvolvimento econômico, porque ambos se condicionam dialeticamente (PINTO, 1960). De tal modo, Vieira Pinto assevera que educar para o desenvolvimento não é tanto transmitir conteúdos particulares de conhecimento, reduzir o ensino a determinadas matérias, nem restringir o saber exclusivamente a assuntos de natureza técnica; é, muito mais do que isto, despertar no educando novo modo de pensar e de sentir a existência, em face das condições nacionais com que se defronta; é dar-lhe a consciência de sua constante relação a um país que precisa do seu trabalho pessoal para modificar o estado de atraso; é fazê-lo receber tudo quanto lhe é ensinado por um novo ângulo de percepção, o de que todo o seu saber deve contribuir para o empenho coletivo de transformação da realidade (PINTO, 1960, p. 121).   

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Para tanto, o financiamento, condizente com uma educação a realizar esse papel, deve ser um dos pontos indeléveis para o seu planejamento, que atente, em sua “tensão dialética”, para o projeto de desenvolvimento exposto. Ademais, se a educação suscita no sujeito uma diferente forma de pensar e sentir a existência, esse saber deve contribuir coletivamente para transformar a realidade. Vieira Pinto acrescenta em sua assertiva anterior o seguinte

Neste momento em que a comunidade brasileira atinge o limiar de consciência nacional, caracterizada por inédita representação de sua realidade, e se dispõe a projetar e empreender o desenvolvimento dos recursos materiais, que a deve conduzir a outro estágio de existência, torna-se indispensável criar novo conceito de educação como parte essencial daquele projeto, e condição do seu completo êxito. Não estamos ainda preparados para dizer qual o plano educacional a realizar, porque se trata justamente de elaborá-lo desde os fundamentos. O que nos parece necessário, no entanto, é imprimir novo rumo à nossa educação, a fim de orientá-la, sem compromisso com qualquer credo político, no sentido da ideologia do desenvolvimento econômico e social. Uma teoria da educação deverá surgir, cuja tarefa inicial será a de definir que tipo de homem se deseja formar para promover o desenvolvimento do País. Apresenta-se, assim, a educação como aspecto capital da teoria do desenvolvimento (1956, p. 43-44).

É notório que a linha da fundamentação teórica do ISEB, representada, nesse caso, por Vieira Pinto, evidencia a existência relacional entre educação e desenvolvimento e a indispensabilidade de a educação ser promovida, em suas diretrizes e bases, concomitantemente com o plano econômico e social.

Já no governo de Jânio Quadros, o Programa de Metas e o Conselho de Desenvolvimento não foram a pedra angular para o planejamento global (Políticas econômicas, sociais e educacionais). Ao substitui-los, Jânio propôs, em 1961, a Comissão Nacional de Planejamento – COPLAN, para construir o sistema de planejamento. Essa Comissão ficou responsável por preparar um Plano Quinquenal de Desenvolvimento Econômico e Social. No entanto, com a renúncia de Jânio Quadros, esse projeto não se concretizou. Coube, então, ao Conselho de Ministros do governo parlamentar (1961-1963), instalado após a saída de Jânio do governo, elaborar um programa de governo, que se estruturou em três pontos: a) plano perspectiva, com a duração de 20 anos, no qual seria delineada, sem maiores detalhes, a evolução quantitativa e estrutural da economia; teria um sentido puramente ordenador das decisões a serem tomadas em prazos menores; b) plano quinquenal, de médio prazo, cobriria um período de cinco anos, sendo anualmente atualizado e estendido por mais um ano; a sua execução deveria ser orientada por planos anuais pormenorizados e sua formulação estaria entregue à Comissão Nacional de Planejamento, a qual seria ativada e dotada de recursos financeiros e técnicos adequados; c) plano de emergência, destinado a dar execução aos projetos já existentes, com cooperação financeira internacional já assegurada (HORTA, 1982, p. 54-55).

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Nesse Programa, a questão educacional estava vinculada ao eixo Desenvolvimento Social. A reiteração de que a educação deve estar em consonância com as metas e com as necessidades do desenvolvimento nacional foi o fio condutor de sustentação da continuidade, de certo modo, do que foi pensado pelos governos anteriores do período desenvolvimentista. Logo, mais uma vez, a palavra-chave foi planejamento. Sem isso, a educação sofreria de desarranjos estruturais, pois as metas, os objetivos, o direcionamento financeiro, os recursos humanos e técnicos e os métodos nortearão racionalmente o sistema educacional brasileiro, orientado pelo processo quantitativo e qualitativo da economia.  

O Programa tornou-se uma espécie de lineamento para traçar um Plano Nacional de Educação – PNE.  Dentro do Conselho de Ministros, o Ministério da Educação e Cultura foi o responsável por formular o PNE, que deveria apresentar as metas educacionais quinquenais, os aportes de recursos, os meios pelos quais eles seriam captados, a fixação mínima de escolaridade, dentre outros itens curriculares e administrativos. O governo parlamentarista centralizou a concepção do planejamento e descentralizou a sua operacionalização, ao induzir estados e municípios a atuarem em sua implementação, com remanejamento financeiro suplementar e cooperação consultiva e técnica do Governo Federal.  

Segundo Horta, a Comissão de Planejamento da Educação – COPLED, instância do Ministério da Educação e Cultura, instituída em 1962, e a COPLAN atuaram na Coordenação Setorial da Educação, com o objetivo de: a) reunir, coordenar ou realizar os estudos e levantamentos necessários ao planejamento plurianual da Educação no País; b) coordenar e harmonizar, em planos gerais e setoriais, os programas e projetos de Educação elaborados por órgãos públicos e entidades privadas, em matéria de Educação; c) assistir os estados e municípios na elaboração dos respectivos planejamentos, oferecendo-lhes a necessária assistência técnica (1982, p. 57).

A COPLED, destarte, ficou encarregada de organizar o Plano Nacional de Educação, não se eximindo de levar em consideração as orientações colocadas pelo Conselho Federal de Educação, pois tal Conselho era responsável por assentar as diretrizes que deveriam ser observadas pela COPLED, ao preparar o Plano. Assim, em 1962, o Conselho Federal de Educação enviou à Comissão de Planejamento da Educação a elaboração de planos de acordo com o Art. 92, parágrafo 2, da LDB. Esses planos do CFE eram uma política de distribuição de recursos dos Fundos Nacionais de Ensino. É importante frisar que o Conselho Federal de Educação, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, não era o vértice para conceber e formatar o Plano Nacional de Educação; somente tinha a responsabilidade de oferecer parâmetros e critérios de distribuição de recursos da União para educação.

Este texto pode se concluir com a constatação de que o Estado, no período em pauta, esteve de maneira contundente na realidade brasileira, em toda sua engrenagem de funcionamento sob o prisma da tecnocracia e do patrimonialismo. Na ótica de um Estado liberal, a racionalidade dos meios sufocou a educação em nome da lógica quantitativa. A concepção liberal, impressa no planejamento da educação, esteve pautada na estrutura de um projeto econômico. Nisso, os Planos de Meta da Educação, formados pelo CFE, ficaram adstritos à execução dos recursos financeiros à educação e a COPLED, a partir desses Planos, empenhou-se em desenvolver o PNE. O protagonismo do Estado liberal brasileiro subordinou as decisões da esfera educacional aos requisitos técnicos da ordem econômica e política. O planejamento pelo governo federal deu-se como instrumento instaurador para elevar o país à condição de Estado moderno, com nuances fortes do nacional-desenvolvimentismo. No seu bojo, a educação aferrava-se na sistemática do planejamento setorial e global. Percebe-se que a propagação da ideologia nacionalista não seria suficiente para constituir um desenvolvimento caso não tivesse uma argamassa política e administrativa, bem como o surgimento de órgãos técnicos. Trata-se, evidentemente, de um Estado respaldado por um patrimonialismo que interferiu massivamente na dinâmica do planejamento brasileiro e, por isso, mas não somente, esse processo foi lento e contraditório no seu aspecto político e econômico. Daí, “a ruptura parcial e a recomposição (sucessiva e alternadamente) das relações políticas e econômicas com a sociedade tradicional e com os sistemas externos” e a “frustração das tentativas de implantação de um modelo de desenvolvimento econômico autônomo” (IANNI, 1971, p. 35).

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