O final do século XIX e o início do século XX foram marcados por mudanças no sistema econômico e produtivo do mundo ocidental pós-revolução industrial.
A Revolução Industrial (ocorrida no século XVIII) já tinha seus reflexos bem definidos com a queda dos sistemas absolutistas, o enriquecimento e consolidação da classe burguesa enquanto classe dominante e dirigente, a hegemonia política e econômica dos países Europeus – Inglaterra, Alemanha e França, a industrialização dos países europeus, o crescimento populacional nos centros urbanos, a formação de uma classe assalariada composta principalmente por operários das fábricas, a formação de uma população consumidora dos bens nacionais e internacionais, a formação de uma elite intelectual identificada com os ideais burgueses, o início do desenvolvimento tecnológico e científico atrelado a produção econômica e política, a consolidação do capitalismo (mercantil e concorrencial) e o expansionismo e exploração colonial em todos os continentes do globo.
É neste contexto que se estabeleceu o Imperialismo, sobre o qual Hobsbawn (1988, p.95), discute que:
O fato maior do século XIX é a criação de uma economia global única, que atinge progressivamente as mais remotas paragens do mundo, uma rede cada vez mais densa de transações econômicas, comunicações e movimentos de bens, dinheiro e pessoas ligando os países desenvolvidos entre si e ao mundo não desenvolvido.
Este fato transformou os países coloniais em produtores especializados de um ou dois produtos primários de exportação para o mercado mundial. Desta forma, as economias tornaram-se cada vez mais dependentes e vulneráveis ao contexto internacional (HOBSBAWN, p.98 -99).
A partir desta divisão implanta-se um novo contexto social, econômico e produtivo e o sistema capitalista concorrencial característico desde o início da Revolução Industrial passa para o Capitalismo Monopolista.
O Capitalismo Monopolista pode ser caracterizado por um financiamento econômico dos países não desenvolvidos em troca de escoamento populacional, compra de matéria-prima barata, ampliação dos mercados consumidores.
Na prática isso se traduz em redução dos impostos de importação dos produtos vindos dos países desenvolvidos e desvalorização dos produtos exportados (pelos países não desenvolvidos).
A tabela abaixo mostra resumidamente as principais características dos dois sistemas capitalistas:
CAPITALISMO CONCORRENCIAL |
CAPITALISMO MONOPOLISTA |
Capitalismo comercial e mercantil |
Capitalismo financeiro |
Século XVIII |
Final do Século XIX e início do século XX |
Primeira Revolução Industrial – Inglaterra |
Segunda Revolução Industrial - EUA |
Apoiado pelos Estados Absolutistas |
Apoiado pelos Estados Burgueses |
Ideais identificados com o sistema monárquico e com a aristocracia |
Ideais identificados com o sistema republicano e com o liberalismo pautado na igualdade, fraternidade e liberdade pregada pelos burgueses |
Apoiado na exploração de produtos tropicais e metais |
Apoiado na exploração de matéria-prima, de mercados consumidores, de mão de obra barata |
Início do crescimento populacional e da acumulação de capital |
Problemas decorrentes do rápido crescimento populacional dos centros urbanos com necessidade de criação de escoamento populacional e de escoamento de capital acumulado |
Produção têxtil |
Produção de bens de consumo em larga escala |
Fábricas como alternativa de trabalho assalariado |
Necessidade de mão de obra barata para a produção |
Tear mecânico, máquina a vapor e locomotiva |
Desenvolvimento de maquinaria para a produção |
Primeiros investimentos em tecnologia |
Tecnologia e ciência juntas em prol do desenvolvimento |
Contexto Nacional
Partamos agora para o contexto do Brasil, não esquecendo que este está diretamente relacionado ao contexto internacional apresentado até agora.
Para que se possa entender um golpe de Estado ou uma revolução é preciso ter um conhecimento amplo da época, é preciso saber quais as transformações que se processam no quadro econômico, social e institucional. É preciso familiarizar-se com as ideias em voga. Não basta conhecer os homens e os episódios, nem mesmo é suficiente saber quais suas opiniões e ideias, qual sua forma de participação. Não basta conhecer as razoes que os contemporâneos invocam, uns para justificar o movimento, outros para criticá-lo ou detê-lo. Ao estudar um golpe de Estado ou uma revolução é necessário que o historiador procure além dos fatos aparentes as razões de ordem estrutural que o motivaram, e que frequentemente escapam à consciência dos contemporâneos. É preciso indagar quais os grupos sociais que se associam para dar o golpe ou fazer uma revolução, contra quem e contra que se dirige o movimento e em favor de quem e de que, e ainda quais as forças que se aglutinam na resistência. É preciso avaliar a extensão do movimento e acompanhar os sucessos posteriores, para verificar se constitui uma revolução que subverte um regime renovando os grupos dirigentes, alterando a ordem social e econômica, ou se não passa de mero golpe de Estado motivado por interesses de minorias que procuram assumir a liderança deslocando outras minorias do poder. É necessário ainda verificar se o movimento atende a aspirações de extensas camadas da sociedade ou se satisfaz apenas à ambição de alguns indivíduos. O conhecimento dos acontecimentos posteriores e das mudanças que se operam na sociedade, na administração, na política, na economia permite em parte responder a essas questões, mas é preciso indagar até que ponto as mudanças correspondem ao programa oficial, aos anseios do grupo revolucionário e até que ponto a revolução se distancia dos objetivos iniciais e toma novos rumos, às vezes mais avançados, às vezes mais retrógrados do que pretendia, negando-se a si mesma, apegando-se a fórmulas passadas. Estas e muitas outras questões se impõem na análise de um movimento revolucionário. (COSTA, 1987, p.267).
De acordo com Costa (1987, p.27) os princípios liberais que chegaram até o Brasil foram importados da Europa, pois aqui não existia uma burguesia que desse suporte a estas ideias. O comportamento dos revolucionários locais, pequenos comerciantes, industriais ou profissionais liberais era identificado com a elite, racista e escravocrata.
Os acontecimentos da segunda metade do século XIX que iram refletir em mudanças na estrutura econômica e social do país durante o período da República Velha, favoreceram o desenvolvimento do mercado interno e o processo de urbanização. Podemos citar entre estes acontecimentos: a transição do trabalho escravo para o trabalho livre, com a entrada dos imigrantes no Brasil (introdução do trabalho assalariado); a instalação da rede ferroviária (desde 1852) e consequente aperfeiçoamento do sistema de transportes (o que propiciaria a exportação do café em maiores escalas), as primeiras iniciativas de industrialização principalmente em São Paulo e no Rio de Janeiro, o desenvolvimento do sistema de crédito.
Assim, neste contexto, é que a Primeira República começa com a queda da monarquia em 1889 após um golpe de Estado que contou com o apoio de representantes de diferentes grupos sociais da época, nos quais estavam envolvidos o setor progressista da lavoura, os fazendeiros de café das áreas mais dinâmicas e produtivas, alguns elementos ligados à indústria, profissionais liberais e militares (COSTAS, 1987, p.276).
Com a Proclamação da República as oligarquias cafeeiras conquistaram o domínio absoluto do aparelho do Estado instaurando o governo representativo, federal e presidencial.
De acordo com Saviani (2007, p.188) o período da República Velha foi marcado pela presença das oligarquias rurais, chamadas também de “Barões do Café”, que se mantiveram no poder através de uma aliança, entre os partidos republicanos paulista e mineiro (política do café com leite) com base nas “eleições a bico de pena” e no coronelismo.
Foi Campos Salles que entregou os estados ao domínio das oligarquias locais, concedendo a eles autonomia para dirigir suas regiões, em troca do apoio destes governantes na esfera federal que tornava desnecessário a preocupação com a ampliação de sua sustentação política, ou seja, de criação de uma base popular de representação política.
Este período foi marcado por uma Política de Defesa e Valorização do Café – o sistema econômico nacional era subjugado para atender aos interesses dos cafeicultores. Com os altos lucros resultantes da exportação do café começa um progressivo desenvolvimento urbano e uma complexificação social (SAVIANI, p.189).
As oligarquias cafeeiras, em especial as de São Paulo, foram beneficiadas em detrimento dos militares. Foi um período de grandes revoltas e manifestações para adquirir o poder do país, com início das primeiras greves, do movimento anarquista e da introdução dos primeiros ideais comunistas no país.
Após a Primeira Guerra (1914-1918) começa uma mudança no modelo econômico agrário-exportador. Com o início da industrialização, vem também a necessidade de mão de obra assalariada, atendida principalmente pelos imigrantes que ficaram ou se deslocaram para os centros urbanos. Surge uma classe de operários que ao mesmo tempo em que trabalhavam, contribuindo para o desenvolvimento do país, também começaram a reivindicar melhores condições de trabalho nas indústrias. Ao mesmo tempo, a formação de uma burguesia industrial urbana, cujos interesses muitas vezes não eram os mesmo dos produtores cafeeiros e dos sistemas oligárquicos dominantes irá influenciar a decadência destes sistemas e na mudança da organização social, política e econômica durante a década de 30.